10 de jul. de 2012

I Encontro de Mulheres da UFRJ - Observações

                Nas últimas duas semanas, participei da construção do I Encontro de Mulheres da UFRJ. Éramos mulheres de umas três ou quatro correntes políticas e com o desejo de nos auto organizarmos, termos em nossas mãos as rédeas da nossa luta. Promovemos quatro mesas com diferentes palestrantes e uma rodada de Grupos de Trabalho para verbalizarmos o acúmulo dos debates e o que queríamos de diferente em nossa universidade e em nosso mundo.
                Sonhei um Encontro com a presença de dezenas de estudantes com dezenas de visões de mundo. Sonhei um Encontro com falas incríveis das palestrantes e problematizações surpreendentes das participantes. Sonhei um Encontro que contasse com a presença de gente que não está no Movimento Estudantil, que não está dentro dessa lógica e que não está familiarizada com o debate feminista.
                Antes de falar do Encontro em si, falo um pouco de mim: eu não tenho muito acúmulo teórico sobre o feminismo. Nem sobre que mundo eu quero no futuro (que vocalizo dizendo “comunista” e tendo a certeza de quão incipientes são as bases dessa afirmação). Ainda tenho muito a ler e muito mais a debater. Mas eu estou (sempre) pronta para um bom debate.  (Sempre) pronta para perguntas que não tinha feito antes e respostas de quem já leu e ouviu mais do que eu, características que cultivo voluntariamente e que prezo em outros também.
                Infelizmente, nem todas as (nem tantas) pessoas que se dispuseram a participar do Encontro gostavam de ouvir discordâncias. A maioria esmagadora de participantes era de rostos que conheço desse gueto que chamamos Movimento Estudantil. E a maioria já foi para lá com uma visão pré-concebida de mundo, querendo apenas fazer com que outros mais a absorvessem também. E as palestrantes? Algumas tiveram falas boas, algumas tiveram problematizações interessantes, muitas ficaram no raso do raso, reproduzindo lugares comuns e atestando desconhecimento (do mundo real mesmo). Cheguei a ouvir na fala de uma delas um causo clássico, de uma vez em que estava se depilando no salão, sentindo muita dor com a cera, e a depiladora disse: “E ainda tem gente que acha que as mulheres são o sexo frágil”. É sério mesmo? Vamos passar horas da nossa vida nos reunindo, organizando um evento, dizendo para as pessoas que será bom, que será diferente, para ter uma mulher que vai lá crente que está abafando dizer uma coisa que eu leria na Nova? Que reproduz lugares-comuns machistas desse nível e ainda quer aplausos no fim?
                Para além disso, me sinto desconfortável em ser a pessoa que fala o tempo todo em Creche Universitária, não é meu assunto favorito. Mas é um assunto que vejo que minhas companheiras e meus companheiros não fazem a menor ideia do que estão tratando, é um dos assuntos que pode dar muito errado se mal conduzido e um assunto que tenho como dar uma mínima contribuição teórica graças à minha mãe. E tenho que ficar batendo sempre nas mesmas teclas quando falamos nesse assunto (assim como sempre tenho que fazer a questão de ordem sobre minha alergia a tabaco em todo e qualquer espaço do M.E. – mesmo que os presentes sejam sempre as mesmas pessoas). As pessoas não se convencem de que quando pedimos que a creche universitária da UFRJ apenas para as mulheres da UFRJ estamos:
a) Reproduzindo a maldita lógica machista de que criança é trabalho de mulher,
b) Esquecendo de que, num geral, quando um homem da UFRJ tem um filho e não tem creche para deixá-lo, não vai deixar de estudar. Vai largar o filho com alguma mulher.

                E ainda decidimos falar sobre o machismo nas calouradas. Beleza, falamos o óbvio do óbvio. Como se ninguém soubesse que os nossos trotes são machistas. O que faltou falar foi de outras tantas práticas machistas da comunidade universitária e da nossa sociedade em geral, faltou (muito) falar foi sobre saúde reprodutiva, faltou (muito) falar de limitação de papeis de gênero e como isso afeta todxs da nossa sociedade.
                Ainda bato com força na tecla que, quando decidimos, em um encontro feminista, separar as questões ligadas à heteronormatividade de nossa sociedade das que mostram outras cores do arco-íris erótico humano, reproduzimos a velha lógica de “eles” e “nós”. Quando não olhamos para nossa sociedade como uma sociedade que valoriza características ligadas a um único modelo de homem e que exclui todo o resto, quando não vemos que “o resto” é um só (com múltiplas nuances de especificidades), temos uma visão fragmentada e parcial da realidade. E não chegamos muito longe (e nos mantemos na lógica opressora).
                Há mais impressões, que não tenho tão concretamente formuladas na minha cabeça. Coisas boas, certamente, que aconteceram. Falas que me intrigaram, conversas de corredor que me animaram. Mas, num geral, ficou um gosto amargo na boca e o sentimento de que não culpo quem decidiu não participar. Eu mesma não sei muito bem do que participei.